Nascemos entre ausências, tanto mais seja a ausência do abrigo uterino primordial. A ausência, nesse sentido, é apenas a natural sucessão do tempo, tanto mais que o instante anterior já não guarde o mesmo do presente. Crescemos entre ausências, mas enquanto não ganhamos a consciência, as ausências permanecem circunscritas ao finito. Tornar-se consciente, o que exige o outro, o que abre os olhos para o outro hoje, ontem e sempre, coloca em cena um conflito irresolúvel entre o finito e o infinito, cria uma miríade de ausências. Com a consciência enxergo o antes de mim e projeto o depois de mim, com a consciência não há barreiras nos horizontes, e a minha condição perecível se opõe à minha consciência do infinito. Já não importam só as ausências da sucessão de realidades diferentes, o que pode deixar uma rápida saudade logo substituída pelo estímulo seguinte, mas é a ausência fundamental da coerência entre vida e morte. Vivemos a morte e morremos com vida, navegamos com saudade do infinito e com inconstância no finito, presente sempre esvaziado por outros tempos. Em mesmo instante, é o próprio finito que destrói a plenitude, é ele que anuncia a singularidade do que ficará nalgum infinito do qual se perderá a consciência. Tantas horas mornas, tantos infinitos diluídos na lassidão do finito, na utopia de ao final do ciclo galgar alguma infinitude, esta, por si, tão assustadora ao finito. É uma maneira de não enlouquecer, a alienação do conflito, o deixar-se viver morto para morrer vivo. Não creio que seja sempre assim: em poucas, raríssimas ocasiões para muitos, há a transcendência, a ultrapassagem do tempo, a indefinível harmonia entre o finito e o infinito, o êxtase. São os encontros num mundo de ausências. Este livro não pretende ser de fórmulas de encontro, ele não poderia. Cada qual tem a sua própria descoberta, a sua própria epifania. O que este livro pretende é disseminar a existência das ausências, menos como uma evidência do drama existencial, e mais como um chamamento a encontros. O mundo formula encontros para manter a utopia do ciclo, mas esses encontros são insatisfatórios, são artificialidades que não escapam à prisão do finito, são encontros para pseudo-ausências também fabricadas. O verdadeiro encontro precisa da consciência das ausências essenciais, por mais que isso revele a perplexidade da vida, por mais que isso estenda o drama da existência. Ainda que poucos sejam os verdadeiros encontros, basta um deles para conferir transcendência, antídoto à loucura do ser, o resgate do ser em substância, não dos não seres que navegam certos de algum sentido num mundo de ausências.
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